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Por Geraldo Sant’Ana de Camargo Barros, coordenador científico do Cepea; e Nicole Rennó Castro, pesquisadora do Cepea
 

O ano de 2020 foi excepcional praticamente em todos os aspectos. A pandemia de covid-19 ditou o comportamento da sociedade global como um todo. A economia mundial, quase sem exceção, evidentemente, teve sua evolução fortemente determinada por esse ataque arrasador ora vindo do lado da oferta, ora da demanda, ora dos dois lados, tudo conforme eram determinados acirramentos ou relaxamentos das medidas de controle, auxílios e subsídios eram repassados à população (estimulando a demanda) ou às empresas (recuperando a oferta). Tais medidas eram implementadas e interrompidas abruptamente causando grande instabilidade. Cadeias produtivas, em geral interdependentes, viam seus elos afetados e obstruídos, seja por falta de insumos, seja por problemas logísticos, tudo diante de uma demanda oscilante e cuja estrutura mudava com os cambiantes hábitos dos consumidores. Uma montanha russa, com grande viés de baixa, marcou a economia mundial.   

 

O FMI estima que, na média, a economia mundial tenha se retraído 4,4% em 2020. Para 2021, trabalha com a taxa positiva de 5,2%. O IPEA calcula que a economia brasileira tenha encolhido 4,3% em 2020; uma taxa de 4% é projetada para 2021. Nos dois casos, apostas otimistas diante das amplas incertezas que 2021 representa.  Mesmo assim, dois anos que, sendo otimistas, somados não terão visto praticamente as economias mundial, em geral, e a brasileira, em particular, saírem do lugar.

 

O ano de 2020 foi tão problemático que, entre as economias minimamente relevantes, apenas a China cresceu: tão somente, para seus padrões, 1,9%. Este miúdo crescimento chinês, entretanto, permitiu manutenção da renda, com o que o país foi um dos principais responsáveis pelo crescimento de 12% no volume exportado pelo agronegócio brasileiro e de 4,8% no correspondente faturamento a despeito de uma queda 6,6% nos preços internacionais em dólares do setor. Estes preços, entretanto, quando internalizados com uma taxa de câmbio que, no decorrer do ano, chegou a desvalorizar em torno de 40% em relação ao ano anterior, acabaram por promover uma aceleração da alta de preços domésticos, os quais – importante enfatizar - já vinham em alta desde 2019. Com isso, o aumento médio foi de 34% nos preços agropecuários entre 2019 e 2020 (46% para grãos e 31% para produtos da pecuária) em termos nominais ou 19% reais.

 

No mercado interno, a demanda foi em boa parte recuperada graças à injeção de mais de R$ 500 bilhões (7% do PIB) na economia na forma, principalmente, de auxílio emergencial e apoio a estados e municípios. O auxilio, que chegou a 42% dos domicílios brasileiros no período de maior valor, praticamente manteve a renda média das famílias (possível queda de 5%) e preparou a recuperação parcial que viria a se verificar no total do ano (com as estimativas de crescimento da economia brasileira passando de -7,5% para -4,3%).  

A produção agropecuária apresentou crescimento satisfatório entre 2019 e 2020. A produção de grãos aumentou 4,5%, segundo a Conab. Essa taxa é praticamente a observada para a soja e o algodão. O milho ficou em 2,5%, feijão e arroz, próximos a 7%. O café chegou a 25% e o trigo alcançou 32%. Não são, de forma alguma, números ruins. Foi, na verdade um recorde de produção. Pelas estimativas preliminares do Cepea, pela ótica do valor adicionado, o volume da produção agrícola expandiu 5%. Porém, o da pecuária encolheu 2,2% - com queda de produção de 6,2% para o boi e estagnação na produção de frango e 2% para o leite; a produção de suínos, do lado positivo, cresceu mais de 9%. O peso do custo das rações pode ter sido importante para esse resultado. Fechando as contas, tem-se que o volume da agropecuária em geral cresceu 2,2%.

 

No balanço de preços e quantidades, o MAPA estima preliminarmente que o Valor Bruto da Produção (VBP) da agropecuária pode ter crescido 15% em termos reais, com 19% para as lavouras e 7% para a pecuária. Os destaques foram a soja (27%), milho (11%), cana (8%) e algodão (6%) entre as lavouras. Na pecuária, sobressaíram-se bovinos (14%) e frango (9%).  Dados do Cepea apontam crescimentos mais fortes para a pecuária: 31% para o boi, 8% para aves e 47% para suínos. De qualquer forma, essas cifras expressivas relativas ao VBP – com forte contribuição dos preços - precisam ser consideradas num contexto temporal mais amplo. Em 2019, o Termo de Troca (Preço do Produto/Preço do Insumo) estava 35% abaixo do seu valor em 2000; em 2020, ainda continua 10% inferior a 2000. Considerando o IGP-DI da FGV, os preços reais agropecuários ainda estão 18% inferiores a 2000. Dito de outra forma, o crescimento de 170% no VBP real ao longo dos últimos 20 anos se deu a despeito do encarecimento relativo dos custos de produção e é explicado, portanto, pelo crescimento do volume produzido – estimado pelo Cepea em cerca de 140% - possibilitado pelo contínuo avanço da produtividade da agropecuária nacional diante de custos crescentes.

 

Já a agroindústria teve um desempenho bem menos satisfatório, com queda estimada preliminarmente de volume produzido em torno de 5%, de acordo com estimativas preliminares do Cepea. Esse segmento – tanto do lado agrícola como pecuário - teria sido bastante afetado no contexto da pandemia. Na agroindústria de base agrícola, crescimento foi observado para a indústria do açúcar, produtos amiláceos e óleos vegetais. Do lado negativo ficaram as indústrias ligadas a vestuário/têxtil, frutas e legumes e etanol. Na agroindústria de base pecuária, a queda foi mais expressiva no abate bovino; aves e, especialmente, suínos cresceram. Ademais, sendo o Brasil um exportador de produtos não processados ou pouco processados, o segmento agroindustrial se beneficiou menos dos estímulos vindos do setor externo (preços e câmbio).  Esse resultado negativo caracterizou o desempenho da indústria de transformação brasileira em geral (em que a agroindústria se insere), que no segundo trimestre teve uma queda de 21% no seu PIB – no primeiro e terceiro também ocorreram pequenas quedas (frente aos mesmos trimestres de 2019). No acumulado do ano a queda da indústria foi de 5,2%, segundo o IBGE, cifra bastante próxima da estimada pelo Cepea para a agroindústria especificamente.

  

Fonte: Cepea

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