O 5º Fórum do Agronegócio, realizado na segunda-feira, 16 de setembro, marcou um novo capítulo para a Sociedade Rural do Paraná. Apostando em uma experiência diferenciada, o evento ocorreu pela primeira vez no Pavilhão Internacional do Parque Ney Braga, em Londrina (PR), e trouxe um formato inédito para o tradicional encontro, que é um dos grandes destaques do calendário anual da entidade e do agronegócio.
O amplo espaço de 1.300 metros quadrados acolheu mais de 350 participantes, incluindo produtores rurais, cooperados, gestores, empresários e jornalistas, oferecendo uma infraestrutura projetada para debates, networking e momentos de integração entre os profissionais.
Para o presidente da SRP, Marcelo Janene El-Kadre, o tema macro do evento, “Resiliência: conexão agronegócio e natureza”, não poderia ser mais assertivo. “A relevância deste Fórum vai além das palavras trocadas. Ele reflete a visão conjunta de que é possível inovar, produzir com responsabilidade e, acima de tudo, evoluir em conjunto com o meio ambiente. As práticas discutidas aqui ecoarão por toda a cadeia produtiva, impulsionando ações concretas para um futuro mais sustentável.”
Além do presidente da Sociedade Rural do Paraná, Marcelo Janene El-Kadre, participaram da cerimônia de abertura o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Pedro Lupion, e o presidente da Federação da Agricultura do Estado do Paraná, Eduardo Ágide Meneguette.
“O Fórum tem que ter um resultado principal que é mostrar que nós do agro temos uma responsabilidade enorme. Sem solo, água ou clima, a gente não produz. E a nossa preocupação é conseguir fazer com que tudo isso funcione, e funcione da melhor maneira possível para que a gente continue sendo os grandes produtores de alimentos do mundo. E é a nossa responsabilidade, apesar de todos os dias tentarem imputar a cada um de nós a culpa por todas essas catástrofes”, pontuou Lupion.
Desafios e oportunidades do agronegócio
Na primeira mesa-redonda, os convidados abordaram os desafios e oportunidades do agronegócio, visando estratégias para um setor mais forte e resiliente. De acordo com a diretora executiva da Sociedade Rural Brasileira, Patrícia Arantes de Paiva de Medeiros, quando se fala em segurança jurídica e incentivo ao setor produtivo, os principais fatores que desafiam o agro são: institucional, político, econômico e ambiental.
A "briga de narrativas" também foi destacada pelos palestrantes como um dos grandes desafios do agronegócio. A diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), Sueme Mori Andrade, afirmou que é preciso fortalecer a representatividade do setor no exterior. “A gente tem muito mais uma atuação de defesa do que uma atuação de apresentação e de explorar oportunidades. O nosso principal desafio é fazer, e fazer no paralelo, aquilo que a gente fez no ponto de vista de produção e produtividade, mas fazer agora no ponto de vista institucional.”
Agronegócio como parte da solução
Com as mudanças climáticas, as alternativas para diminuir os impactos na vida de toda a sociedade são urgentes. No segundo debate, “Impactos climáticos: agronegócio como parte da solução”, o agronegócio foi mencionado como uma das alternativas para auxiliar na solução desses problemas. Segundo Carolina Graça, former head de Sustentabilidade da Bayer, a agricultura regenerativa, que tem como base a saúde do solo, é praticada no país há muito tempo através de práticas como o plantio direto, a rotação de culturas e os processos de otimização no campo. “Essa é uma boa notícia. Essas práticas já são conhecidas nossas. Para sair do patamar atual para um patamar mais avançado, para nós, já faz parte do nosso processo, está no nosso imaginário, na nossa rota de desenvolvimento.”
Dentre os assuntos em destaque, foram mencionados o mercado de carbono e a importância de investir em um conhecimento meteorológico confiável. Caio Souza, head de agronegócios do Climatempo, disse que, atualmente, “meteorologia não é custo, é investimento”, e que neste ano, por exemplo, a região de Londrina terá menos chuva no mês de setembro, sendo que o maior volume está concentrado na primeira quinzena de outubro, o que reflete nas decisões para a próxima safra.
“Estamos vivenciando um fenômeno que denomino de ‘segunda revolução climática do agronegócio’. A primeira foi quando o agronegócio começou a entender que a previsão era importante. Essa segunda diz respeito a como a gente vai aplicar a meteorologia em problemas reais, como trazer isso em diferentes modalidades de negócio dentro do agro”, pontua o meteorologista.
A MyCarbon conta com mais de 20 mil hectares em análise física do solo e, segundo o gerente de Produto, Guilherme Ferraudo, é possível afirmar que “a maioria são solos com alta fertilidade e baixa produtividade devido à ausência de carbono e baixa vida no solo ao redor no Brasil, inclusive em áreas irrigadas.”
Ele explica que a ferramenta necessária para aumentar produtividade e carbono no Brasil é o processo de fotossíntese. “Quanto mais atividade fotossintética tiver, mais removeremos o gás de efeito estufa, que é o CO2, trazendo vida para o solo, que terá um ciclo virtuoso em busca da produtividade e resiliência do sistema produtivo.”
Ana Euler, diretora de Negócios da Embrapa, destacou a importância de tecnologias que podem contribuir com um caminho de transição ecológica para a agricultura brasileira. “Uma das principais estratégias são os sistemas integrados de produção, como o ILPF, que, associados a outras tecnologias, como o uso dos bioinsumos, ajudam a melhor planejar e diminuir o uso de insumos nas lavouras e antecipar cenários de vulnerabilidade como, por exemplo os incêndios que temos passado hoje no Brasil.”
De acordo com o gerente de Sustentabilidade e Inovação da ADAMA, Roberson Marczak, hoje, a maioria das empresas trabalha com os mesmos produtos químicos e o que as diferencia é justamente formulações que sejam mais sustentáveis. Destaca ainda que uma das vertentes de trabalho da ADAMA é o incentivo e educação do uso correto dos produtos.
Segurança alimentar
Na terceira mesa redonda “Do campo à mesa: a jornada para garantir a segurança alimentar”, Eduardo Brito Bastos, presidente da Câmara do AgroCarbono, do Ministério da Agricultura e Pecuária, lembrou que o mundo passa por várias crises e o Brasil pode entregar solução para três delas: crise alimentar, ambiental e a crise energética. “Podemos gerar comida para 25% do mundo, podemos gerar carbono para 25% do mundo e podemos gerar energia renovável para 25% do mundo”. Para ele, governo, universidades, produtores e sociedade organizada, devem caminhar juntos para alcançar esse patamar.
Segundo o representante do MAPA, a outra grande questão é a regulamentação da lei do mercado de carbono, mas, segundo Eduardo Bastos, existe a possibilidade de as normas serem aprovadas antes da COP 2024, Conferência das Partes da Convenção, que será realizada em outubro deste ano no Azerbaijão. Eduardo lembrou também que em 2025 o Brasil sediará uma COP.
No mesmo painel foi abordada a importância da certificação das práticas sustentáveis no campo. Segundo Juliani Arimura, representante LATAM da FSSC, “a certificação é uma forma de comprovar globalmente de que as práticas desejáveis, dentro de um comércio global, estão sendo praticadas pelas organizações. É um reconhecimento que ajuda as empresas a demonstrar que têm um sistema de gestão confiável e atingir os seus objetivos de negócio.”
Para Laura Vicentini, produtora sustentável e proprietária da Spinagro, os incentivos à produção sustentável ainda não alcançam plenamente os produtores. “Um dos desafios é o produtor se enxergar sustentável, porque a gente realmente tem um desconhecimento muito grande do que as nossas lavouras têm potencial de fazer. E existe também um desalinhamento entre a pessoa que produz e a pessoa que consome e, que é um delay entre toda essa produção bem-feita e a questão de a informação chegar da maneira correta.”
O representante da FAO no Brasil, Jorge Meza, afirma que é preciso ter a compreensão básica de que segurança alimentar é um estado no qual todas as pessoas possuem em todo o momento alimentos suficientes, em qualidade e quantidade, para uma vida física e intelectual apropriada. “Quando falamos em segurança alimentar e nutricional, podemos destacar quatro pilares: o primeiro é entender que ter alimentos que são demandados pelas populações é importantíssimo, mas não é suficiente. O segundo é a estabilidade na produção. O terceiro elemento é o acesso físico e econômico aos alimentos. O quarto elemento é o que vemos em muitos países - a dificuldade no uso nutricionalmente apropriado dos alimentos. Quer dizer que as pessoas precisam estar se alimentando bem. Atualmente, já temos um problema onde existe mais pessoas em situação de sobrepeso do que pessoas com subnutrição. As duas são situações muito graves.”
Renata Ernlund Freitas de Macedo, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da PUCPR, enfatizou a importância da integração entre a academia e o setor privado. “Durante muitos anos, principalmente aqui no Brasil, tínhamos academia focadas muito dentro dos seus próprios muros. É fundamental desenvolver pesquisas conjuntas para resolvermos problemas práticos da sociedade e impactar essa sociedade.”
Comunicação do agronegócio
A dificuldade na comunicação foi um ponto bastante mencionado durante o Fórum do Agronegócio. O maior desafio, segundo os convidados, é transmitir uma mensagem real do agro, de forma simples. O tema reuniu especialistas no painel “Como comunicar a relação agro/natureza para fora da porteira”.
O jornalista de agro e macroeconomia do grupo Exame, Cézar Rezende, afirmou que as empresas precisam mostrar as boas práticas do agro, dar acesso aos comunicadores do que está acontecendo de positivo no setor.
A educação brasileira também foi pauta do encontro. A presidente do De Olho no Material Escolar, Letícia Jacintho, afirmou que o material didático brasileiro está longe da realidade do setor e que é preciso consertar a base antes de se trabalhar outras esferas. “Através de um trabalho desenvolvido com a Fundação Instituto e Administração da USP, foi analisado 80% do material didático comprado pelo governo no último PNLD [Programa Nacional do Livro e do Material Didático] e distribuído nos estados e municípios. Foi constatado 60% a mais de menções negativas do agro. E o mais preocupante: 3,7% tinham fontes científicas. 96% do nosso material é ‘eu acho’. A gente vai ter que aumentar a produtividade nas áreas que nós temos e só vai ter isso se ensinarmos as crianças na escola.”
Diana Jank, gerente de Marketing da Letti A², concordou e reforçou que não existe comunicação sem educação. “A gente precisa dar as ferramentas para que as crianças e os jovens tenham capacidade e discernimento de fomentar discussões e ser as cabeças que vão gerar transformações no futuro. Porteira dentro temos muito potencial e muita força, mas isso não fura a bolha. Esse é o grande dilema. E não se trata de plataforma, mas é o tal de adaptar a linguagem para fazer com que ela chegue com credibilidade. Porque não basta a gente ser ouvido, a gente tem que ser compreendido e respeitado.”
A CEO da Beckhauser, Mariana Soletti Beckheuser, afirma que o agro precisa ‘se despir de contra-atacar’ e se dispor a contar de verdade sobre o que é feito e o porquê é feito. “Se a gente ficar só cuspindo dados, a gente não consegue se conectar. A gente fecha portas, às vezes no começo da conversa, porque colocamos rótulos, mas a gente precisa se colocar no lugar de que ‘estamos a serviço’, produzindo comida, roupa, e comunicar, porque a gente fica refém de poucas falas - mas barulhentas, com uma desinformação que ocupa um espaço enorme.
Bem-estar animal
Para finalizar o evento, a Sociedade Rural do Paraná convidou a empresária rural e comunicadora do agro, Carmen Perez, para falar sobre as práticas de bem-estar animal que ela implementou nas fazendas. Segundo ela, o bem-estar animal engloba a nutrição, ambiente, saúde, comportamento e estados mentais. Todos esses aspectos estão diretamente ligados à produtividade.
Uma das práticas adotadas por Carmen foi a “imprinting”, uma massagem nos bezerros nos primeiros dias de vida, o que resultou em animais mais confiantes e mais calmos.